ela era uma princesa, mas nem sempre gostava de agir como tal. sua doçura e seu carisma estavam sempre lá, intrínsecos em sua personalidade. mas às vezes ela se sentia cansada de suas obrigações como princesa e desejava intensamente ter uns dias de descanso.
por uma grande e inesperada coincidência, o destino um dia lhe sorriu e a princesa se viu em uma situação nova e animadora. poderia, finalmente, fugir de sua realidade e viver tal qual uma moça comum por 48 horas. lá, bem longe de seu reino, em terras que ela ainda não conhecia, conheceria pessoas que talvez nem soubessem de sua existência.
viajou de carruagem, acompanhada por um servo (termo esse que a princesa, aliás, não gostava. para ela, seus ajudantes eram todos considerados seus amigos). deixou pra trás suas roupas chiques, seus sapatos novos e, principalmente, a sua coroa. usando um vestido simples e o cabelo em trança, ela podia facilmente se confundir com os moradores daquela pequena e distante cidade.
após muito caminhar na companhia de seu fiel escudeiro, conhecendo todas as vielas floridas e os simples estabelecimentos comerciais do vilarejo, eles acabaram por encontrar um local muito acolhedor para o jantar. logo na entrada, foram recebidos por um jovem muito simpático que os conduziu até aquela conhecida como "a melhor mesa da casa". o garçom, de alma naturalmente solícita, percebeu de pronto que os dois eram forasteiros. apesar de tentarem ao máximo se portar como moradores locais, o jovem viu instantaneamente que algo neles era diferente. se apressou a lhes explicar quais eram os pratos da noite e, ainda, qual deles era o seu predileto. a princesa acatou a sugestão e sentiu-se satisfeitíssima após tomar duas vasilhas da sopa de batatas que o garçom tanto elogiara. após a refeição, os dois se demoraram pelo menos quarenta minutos ainda sentados, apreciando aquela atmosfera caseira e aconchegante que, além de tudo, contava com um grupo de animados senhores que tocavam diversos instrumentos musicais e cantavam uma música nunca antes ouvida pela princesa.
quando finalmente decidiram se levantar e pagar pelos serviços a eles prestados, o garçom se dirigiu novamente aos dois e disse, discretamente, que gostaria de falar com a princesa a sós. seu servo, sabendo do risco que aquilo representava, prontamente disse que não poderia permitir. então a moça, sempre sorrindo, disse que não havia o menor problema em deixar que seu "amigo" escutasse aquela conversa. um tanto encabulado, o garçom os acompanhou até o lado de fora do estabelecimento e, criando uma faísca de coragem, disse em um volume quase inaudível: "você é uma princesa, não é?".
espantados, a menina e o servo trocaram olhares nervosos. para o garçom, aquela reação valia mais do que um "sim". ainda nervosa, ela quis saber o que em sua atitude a denunciara. com uma expressão de encantamento estampada em sua face, o garçom respondeu que ela era graciosa demais para ser uma moça comum, que tudo nela tinha traços de princesa. desde os cabelos despretensiosamente arrumados ao sorriso que nunca deixava o seu rosto.
sentindo-se levemente envergonhada, as bochechas dela adquiriram tom avermelhado muito evidente, o que só reforçou ainda mais essa tal delicadeza que o jovem acabara de descrever. agradecendo o elogio e pedindo ao garçom que guardasse a sete chaves o seu segredo, ela se despediu. disse também que gostaria muito de retornar o mais breve possível para vivenciar outra experiência tão agradável quanto aquela.
o que fez com que a princesa pudesse viver essa aventura é secundário e, portanto, não cabe ser contado nessa história. o que importa é que, desde então, sua percepção do mundo - e de si própria - nunca mais fora a mesma.