aquela era uma tarde fria, em que o vento gelado bagunçava o cabelo das meninas e causava um arrepio desconfortável nas nucas descobertas da maioria dos homens. o céu cinza se misturava aos prédios altos e monocromáticos, deixando um clima melancólico no ar. mas a população parecia não se importar com nada disso, talvez todo mundo já estivesse acostumado. todo mundo, menos ela.
bianca saiu de casa vestindo dois casacos e um cachecol de lã, porque o frio a incomodava intensamente. sua casa parecia um iglu, então ela resolveu que precisava caminhar até a cafeteria mais próxima pra aquecer seu corpo e sua alma com alguma das bebidas de lá. apressou seus passos pra não dar muita chance ao vento que batia forte contra o seu rosto e sentiu um grande alívio quando fechou atrás de si a porta da cafeteria. lá dentro estava tão confortável e quentinho que seus casacos já não se faziam necessários. após alguns minutos parada em frente ao quadro na parede, que servia de cardápio, ela se decidiu por um cappuccino do maior tamanho e por um pedaço de bolo de banana. só de estar em um lugar colorido, com cheiro de café e com pessoas falantes e, aparentemente, felizes ao seu redor, ela já se sentia melhor. bianca se dirigiu ao caixa, fez seu pedido e, após alguns instantes, ela já estava sentada em sua mesa de canto esquentando as mãos ao segurar seu copo.
quando seu cappuccino já estava pela metade e seu bolo quase chegando ao fim, um garoto alto e de cabelos escuros entrou na cafeteria. seus olhares se cruzaram por uma fração de segundo e então ele foi ao balcão pedir seu chocolate quente. o menino sentou em uma mesa próxima a de bianca e tirou da mochila um livro de capa verde, que ela reconheceu instantaneamente, já que se tratava de um dos seus três preferidos no mundo. um sentimento engraçado foi crescendo dentro dela, um calor maior do que aquele proporcionado pelo café quente. seus olhos se iluminaram e ela sentiu que precisava conhecer melhor aquele garoto. tomada por uma coragem que surgiu sem mais nem menos, bianca o chamou e, interrompendo a sua leitura, começou a puxar assunto com ele. os dois se afinaram logo de cara e, em pouco tempo de conversa, já haviam descoberto várias coisas em comum. eles combinaram de se encontrar outras vezes naquela mesma cafeteria e um amor enlouquecedor cresceu entre os dois.
tudo se passou tão rápido e repentinamente que bianca parecia estar sonhando. e, na verdade, ela estava mesmo. no ápice de um dos beijos apaixonados entre o casal, a menina acordou. estava deitada no sofá de sua casa, enrolada em uma coberta grossa para se proteger do frio que fazia. seu sentimento de frustração duplicou quando ela percebeu que, além de não ter realmente conhecido o suposto amor da sua vida, o clima lá fora estava igual ao de seu sonho. cinza e sem graça, do jeito que ela menos gostava. bianca fechou seus olhos com força e tentou ao máximo retornar pro sonho de onde ela jamais gostaria de ter saído, mas seu esforço foi em vão. vencida pelo cansaço, ela se levantou e foi até a cozinha tomar uma xícara de café. pelo menos o calor causado pela bebida quente poderia ser fielmente reproduzido na vida real.