sábado, 7 de abril de 2018

machismo nosso de cada dia

uma vez eu fui com o namorado numa lanchonete e a atendente só falou comigo. a moça ignorou a presença dele. deu boa noite olhando só pra mim, tirou o pedido comigo, entregou a conta pra mim. na hora de irmos embora, se despediu só de mim. ele ficou mordido, nunca tinha passado por isso antes. "que mal educada, foi como se eu nem estivesse lá".

eu achei o máximo.

ele nunca tinha sequer percebido antes, mas isso é o que acontece comigo em 90% das vezes em que a gente sai. o garçom chega na nossa mesa e pergunta se ele tá pronto pra pedir, nem se dá ao trabalho de virar o rosto na minha direção. não me pergunta o que eu quero, pergunta pra ele. na hora de fechar a conta, entrega na mão dele. como se só ele tivesse o direito de escolher a comida, como se só ele tivesse condição de bancar a refeição.

depois desse dia, ele começou a reparar no tanto de garçom (é sempre homem) que faz essa distinção entre nós dois na hora de nos atender. dá pra perceber que ele fica desconfortável, porque sabe o tamanho do privilégio que tem nas costas. mas antes de ele sentir na própria pele, isso não era uma questão. era algo que passava completamente despercebido. em compensação, eu já estou tão acostumada a ser ignorada pelo garçom quando saio com ele que sequer me importo mais. 

não quer me atender, só fala com o homem da mesa? tranquilo, campeão. melhor pra mim que não tenho que interagir com você, um ser tão mal educado. mas que a gente se sente diminuída quando esse tipo de coisa acontece, ah se sente...

eis que namorado e eu fomos num bar, onde é mais comum que eu seja ignorada pelos garçons. o cara que nos atendeu sequer respondeu quando eu dei boa noite. então eu também ignorei o homem, comi feliz da vida, bebi drinks. na hora de pagar, o boy falou que dessa vez ia arcar com a conta toda (normalmente a gente divide). mas o garçom foi tão deselegante comigo que meu namorado me disse pra passar o cartão no lugar dele, como se eu estivesse bancando tudo. só pra gente ver a reação do cara.

como era de se esperar, ele entregou a conta diretamente na mão do boy. aí ele me repassou, eu conferi o valor e falei que podia passar tudo no meu cartão. digitei a senha, falei que não precisava da minha via, agradeci e dei boa noite. aí sim ele me respondeu.

ser mulher é isso. só me tornei digna de resposta depois de bancar a conta. antes disso, nem o mínimo da educação eu merecia.

seguimos na luta.