quinta-feira, 3 de setembro de 2020

adulta, eu?

digo com tranquilidade e sem o menor medo de ser feliz que eu sou uma das pessoas mais mimadas que eu conheço.

claro que já ouvi uns nãos nessa vida, mas sempre tive liberdade pra fazer, falar e pedir tudo. e sempre fui mais livre ainda pra não fazer o que eu não tava afim, o que eu acho que é mais especial. além disso, meus pais sempre fizeram por mim tudo o que eles podiam. desde ficar na janela me esperando quando eu voltava do trabalho à noite até passar no mercado só porque eu comentei que tava com vontade de comer alguma coisa específica, os mimos são muito diversos. agora, aos 25 anos, já pagando o meu próprio aluguel, continuo sendo a mesma filhinha de papai (e de mamãe, óbvio) que eu sempre fui.

pois bem.

eis que um dia dessa semana eu estava voltando do mercado a pé, com sacola na mão, acompanhada pelo meu digníssimo, quando pisei em falso num degrau despropositado na calçada e me estabaquei no chão. uma coisa assim meio regina duarte mesmo, mas sem ser por motivos de celular. olhei pro lado quando passamos por um salão de cabeleireiro e PLÓFT. não vi o degrau, torci o pé, cai bonito. aliás, pode ser até que eu quebrasse uns dentes se o boy não tivesse ali do lado pra me segurar na hora.

além da dor, que não foi pouca, levei um baita susto e minha pressão caiu. ignorei as recomendações sanitárias em tempos de coronavírus e sentei na calçada, eu não tinha condições de continuar em pé. coloquei a cabeça pra baixo, no meio dos joelhos, e tentei normalizar a respiração enquanto pensava "tomara que não tenha quebrado tomara que não tenha quebrado tomara que não tenha quebrado". ficamos ali por uns bons minutos, até que eu conseguisse me recuperar pra continuar o trajeto até em casa. por sorte, já estávamos na esquina da nossa rua. do ponto onde nós paramos até a entrada do prédio deve ter, no máximo, uns 150 metros. 

quando achei que já dava pra tentar seguir em frente, me escorei no namorado e andamos uns poucos passos até a minha vista escurecer de novo. tava doendo bastante pra pisar e minha pressão tinha voltado a me deixar na mão, então pedi pra parar e voltei a sentar na calçada. nesse ponto, além de torcer pra não ter quebrado nada, também tava torcendo pra ninguém com coronavírus ter cuspido justo ali onde eu sentei... repetimos ainda mais uma vez esse processo de sentar + colocar a cabeça entre os joelhos + continuar andando, até que finalmente chegamos em casa.

sentei na cadeira da sala, conferi o nível do inchaço do pé e, como boa adulta que sou, liguei pra minha mãe. aliás, minha vontade era de ter ligado lá do meio da rua mesmo! queria ter pedido o resgate pros meus pais na hora que me estatelei, mas o boy não gostou dessa ideia. e ele estava certíssimo, porque a casa dos meus pais fica do outro lado da cidade, então isso não fazia sentido nenhum (e possivelmente meu pai teria vindo me resgatar, ainda por cima). mas pra mim, na posição de filha mais mimada do mundo, era a única alternativa possível naquele momento de dor feat. sofrimento feat. não sei o que fazer por favor alguém me salva.

no telefone, enquanto o digníssimo colocava gelo no meu pé, contei pros meus pais o que tinha acontecido. recebi dicas de cuidados (papai jogava futebol e vivia contundido) e, depois do tchau, ouvi os dois falando antes de desligar "mas ela é muito medrosa, né? essa menina não dá" kkkkk sim, infelizmente muito medrosa mesmo, não pude nem discordar. mas não temos carro, estamos no meio de uma pandemia e hospital era o último lugar onde eu gostaria de ir nesse momento. o estômago chegou a embrulhar só de pensar.

no fim das contas, aparentemente não quebrou mesmo. ficou muito inchado, completamente roxo e dolorido demais pra pisar no chão normalmente, então durante minha recuperação passei a maior parte do tempo com o pé bem paradinho, apoiado pra cima, evitando ao máximo piorar a situação. mas nada que gelo, pomada, analgésico e cuidados especiais do namorado não tenham resolvido!

lembrei que quando eu era mais nova, com uns 12 anos mais ou menos, eu jurava de pé junto que aos 25 a minha vida estaria 100% resolvida e eu já poderia ter filhos, porque sem sombra de dúvidas eu estaria muito bem casada, teria um emprego incrível com um salário ótimo e obviamente me sentiria realizada em tudo. 

agora que cheguei nessa idade eu vejo que, por mais que eu não esteja tão mal assim, estou absolutamente longe de ter tudo nos trilhos. deus me livre e guarde de ter um filho agora. ainda não consigo nem lidar sozinha* com um pé torcido, imagina criar outro ser humano?????? aliás, será que os meus pais já sabem lidar de verdade com os problemas deles ou só fingem muito bem pra acalmar o meu coração????

se eles estiverem fingindo, espero que eu também minta assim tão bem quando chegar a minha hora de ser chamada de mãe. 


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* falei pros meus pais no telefone que não sabia o que fazer pra me virar sozinha pós acidente e a primeira coisa que meu pai falou foi "ué, mas cadê o leo?". e a primeira coisa que o boy fez foi me perguntar "ué, mas e eu?". expliquei para todos que, naquele contexto, "sozinha" queria dizer "sem meus pais ou quaisquer outros adultos responsáveis que poderiam tomar conta da minha vida e decidir coisas importantes por mim". ¯\_(ツ)_/¯

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